“Seu lugar é na senzala escravo do diabo”, essa foi uma das mensagens jogadas dentro da Casa de Religião de Matriz Africana e Associação São Jeronimo e São Jorge no bairro Ana Terra, em Colombo, durante um ato de vandalismo, racismo e intolerância religiosa na madrugada da última quarta-feira (01).
Em meio a processos, denúncias e perseguição religiosa, o Pai Jorge teve que passar por mais um capítulo do que é ser negro e de uma religião de matriz africana. Na fachada da Casa de Candomblé, que também funciona como associação beneficente e atende a comunidade com cestas básicas, medicamentos e advogados para a população carente, foi pichado os dizeres “Deus é Maior”. Para dentro do local, foi jogado em uma garrafa pet, alguns bilhetes com intolerância e com claros dizeres de racismo, como “Seu Lugar é na Senzala escravo do diabo”
Conversamos com o Pai Jorge, um dos fundadores da casa Ile Ase Ayra Kiniba, Associação beneficente afro-brasileira São Jeronimo e São Jorge, que nos relatou as dificuldades que tem tido para manter o espaço aberto, já que algumas vizinhas evangélicas passaram a denunciar as atividades e ritos da casa. Uma delas chegou a processar a casa, mas acabou perdendo o processo, pois é livre a prática religiosa, seja ela qual for.
“Tivemos uma ação em 2007, e terminou em 2010, mesma questão do barulho que incomodava demais, a gente ganhou a ação, a juíza entendeu que não incomodava e assim ganhamos a primeira ação em 10 de julho de 2010” Contou ele que foi a primeira batalha no âmbito judicial que tiveram. Agora outra vizinha, já que a anterior não poderia entrar com a mesma ação, processou a casa pelo mesmo motivo, porém desta vez foram em três pessoas ao portão do espaço e começaram a ofender a religião e Pai Jorge, profetizando que a casa seria partida no meio em nome de Jesus, isto em meio a um período de celebração com pessoas de todo o Brasil, confraternizando no espaço a sua fé.
A partir dai ele teve que buscar se adequar, com isolamento acústico no espaço. Porém o alto custo e o tempo que a prefeitura deu para adequação, culminou com eles não terminando a tempo. Na Secretária de Meio Ambiente, eles pediram um prazo a mais, o que foi dito, que se ele não conseguisse a tempo, voltariam lá e eles estenderiam o prazo, ele chegou a fazer uma vakinha online para levantar o dinheiro, mas ainda não conseguiu concluir a reforma. Com o não cumprimento dos prazos, a prefeitura acabou multando o local. Eles então protocolaram um pedido dos dados do processo, para apresentarem a defesa, mas devido ao Coronavírus, a prefeitura não encaminhou os documentos solicitados. Agora no último sábado (26), o oficial de justiça esteve no local e caçou o alvará e intimou Pai Jorge e a proibição por parte do Ministério Público de realizar qualquer atividade religiosa, sob a pena de multa diária de 500R$, já que ele não apresentou defesa.
“Para me mandar os documentos para montar minha defesa, não podia por causa do vírus, mas o oficial vir aqui num sábado mesmo com o vírus pode”.
O bairro tem algumas dezenas de igrejas evangélicas, todas sem isolamento acústico, e algumas até sem alvará de funcionamento e nenhuma foi multada até então
Após isto agora de terça pra quarta, após aquele temporal que atingiu Colombo, algum ou alguns intolerantes picharam a fachada do local, a arremessaram uma garrafa pet com vários recados, intolerantes e racistas. Ele nos contou que já chegou a pensar em fechar o local, mas pensou bem, e viu que o trabalho que fazem para comunidade é maior que tudo isto e que vão enfrentar a violência e discriminação na justiça:
“Estamos abrindo um processo por intolerância religiosa, o Candiero do Centro Cultural Humaitá, que está nos dando uma força muito grande pra gente, não tem como não ver que não é intolerância, não é uma briga de vizinhos”
Também conversamos com o Vereador Anderson Prego, que é amplo defensor da igualdade racial e religiosa “Eu tenho acompanhado isto algum tempo, estas ações do terreiro do Pai Jorge. Primeiro eu acho importante a gente exaltar que o exercício das religiões é livre e não podem sofrer nenhum tipo de perseguição ou discriminação. A ideia é não penalizar as igrejas evangélicas que fazem barulhos, mas também não punir um terreiro, por que tem um rito, traz, no seu corpo, a questão dos instrumentos tocado a mão, não é um som mecânico, é manual e este som não deve atrapalhar tanto a vizinhança. (...) Não podemos admitir que possa um templo religioso sofrer vandalismo e perseguição” o concluiu.
Continuaremos acompanhando o caso, com esperança que os culpados sejam encontrados e que o racismo e a intolerância religiosa não ocorram mais em Colombo.
Por Ale Schneider Colaboração Elisson Maia
Fotos: Ale Schneider
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