Ao menos cinco delatores da Odebrecht relataram à Procuradoria-Geral
da República detalhes sobre a reforma feita em um sítio em Atibaia, no
interior de São Paulo, que investigadores suspeitam ser do ex-presidente
Luiz Inácio Lula da Silva. Entre eles, o patriarca da família, Emílio
Odebrecht, disse ter informado Lula sobre o andamento da obra em reunião
no Palácio do Planalto. Também delator, o engenheiro Emyr Diniz Costa
Júnior afirmou ter comprado até um cofre para guardar o dinheiro usado
para reformar o imóvel.
Os depoimentos reforçam as suspeitas da força-tarefa da Operação Lava
Jato em Curitiba de que Lula é o real proprietário do imóvel e as
benfeitorias serviram de contrapartida da empreiteira pela atuação do
petista em favor do grupo na época em que foi presidente, o que
configura propina. Um inquérito aberto há cerca de um ano sobre o caso
foi prorrogado em janeiro e está em fase final.
O principal argumento da defesa de Lula é de que a propriedade não
está em seu nome. A defesa admite, porém, que o ex-presidente esteve no
imóvel algumas vezes com a família. Para investigadores, o registro em
nome de outras pessoas seria uma forma ocultar patrimônio.
Em delação, Emílio disse ter relatado a Lula, em reunião no Planalto,
em 2010, que as obras no sítio ficariam prontas no mês seguinte. O
encontro, segundo ele, ocorreu no fim do ano, próximo do fim do mandato
do então presidente.
Emílio relatou aos procuradores que, no encontro, o petista não teria
ficado “surpreso” com a informação. “Eu disse: ‘Olhe, chefe, o senhor
vai ter uma surpresa e vamos garantir o prazo que nós tínhamos dado no
problema lá do sítio’.” Anotações e e-mails foram entregues pelo delator
como forma de comprovar a reunião.
Um dos principais interlocutores da Odebrecht com Lula, o ex-diretor
de Relações Institucionais Alexandrino Alencar, afirmou que o pedido
para a reforma no sítio foi feito pela então primeira-dama, Marisa
Letícia, que morreu em fevereiro.
“Ela me falou sobre um sítio e me perguntou se a companhia poderia
ajudá-los a finalizar obras e reformas que estariam atrasadas, porque a
equipe que fazia o trabalho estava com desempenho medíocre”, afirmou.
Segundo o delator, Marisa disse que ela e o ex-presidente pretendiam
frequentar o imóvel a partir de janeiro do ano seguinte.
‘Contrapartidas’
Além dos depoimentos nos quais relata sua relação com Lula,
Alexandrino entregou aos procuradores uma relação de nove episódios em
que a empreiteira atendeu a pedidos do ex-presidente. Segundo ele, eram
“contrapartidas ao apoio e à influência política recebidos ao longo do
tempo pelo atendimento das questões de interesse da companhia”. Na lista
consta, além do sítio em Atibaia, itens como a construção do estádio do
Corinthians, em Itaquera, e uma mesada para Frei Chico, irmão de Lula.
Alexandrino também afirmou que, em 2011, procurou o advogado Roberto
Teixeira, amigo de Lula, para acertar uma maneira de “formalizar” as
obras. Na ocasião, segundo o delator, eles combinaram de forjar notas
para justificar os gastos na reforma. “Ele estava preocupado, digamos,
como é que poderia aparecer essa obra sem um vínculo com os
proprietários do sítio”, disse o ex-diretor. Ao todo, segundo ele, a
Odebrecht gastou R$ 1 milhão na obra.
Em depoimentos, o ex-presidente da empreiteira Marcelo Odebrecht e o
ex-diretor da empresa em São Paulo Carlos Armando Paschoal também tratam
da obra no sítio.
Cofre
Destacado pela empresa para acompanhar a reforma, o engenheiro Emyr
Diniz Costa Júnior disse em delação que ajudou a elaborar um contrato
falso para esconder a participação da Odebrecht. Ele afirmou ainda que
comprou um cofre para guardar R$ 500 mil repassados, em espécie, pela
empreiteira para executar a obra.
De acordo com o engenheiro, o dinheiro saía do Setor de Operações
Estruturadas, o “departamento da propina” da empreiteira. “Eu liguei
para ela (secretária do setor) e pedi os R$ 500 mil. Como eu nunca tinha
manejado, em uma obra, uma soma dessa natureza, eu comprei um cofre
especificamente e coloquei dentro de um armário na minha sala, dentro do
meu escritório.”
Segundo Costa Júnior, o pedido feito pelo então ajudante de ordem da
Presidência Rogério Aurélio Pimentel era para construir uma “pequena
casa para alojamento dos seguranças do presidente”, “um campo de
futebol”, “uma edícula de quatro suítes atrás da casa principal do
sítio”, “uma adega para os vinhos de Lula”, além da construção de uma
sauna.
Defesa
O advogado Cristiano Zanin Martins, que defende o ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva, afirmou nesta quarta-feira, 19, que o sítio não
pertence ao seu cliente e que não há qualquer acusação formal sobre o
caso. “Com relação às delações da Odebrecht, o que temos sempre
respondido é que são declarações unilaterais de pessoas que têm
interesse em negociar estas declarações em troca de liberdade ou
benefícios”, afirmou o advogado.
Em nota, o advogado Roberto Teixeira disse que “jamais propôs,
orientou ou executou qualquer ato ilegal” no exercício da advocacia.
Segundo ele, o delator admite que o sítio era de Fernando Bittar, seu
cliente. “Minha atuação, enquanto seu advogado, era a de formalizar as
obras realizadas como condição para que meu cliente fizesse o pagamento
do valor devido pelos serviços.” As informações são do jornal O Estado
de S. Paulo
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